Semana passada, Meu pai, pobre vendedor de uma fornecedora para grandes empresas chegou dia desses pra mim e disse:
- Pobretão júnior, um cliente meu ficou super meu amigo e me chamou para participar de uma reunião do clube do vinhos, você que ir? Pode ser bom pro seu network.
Vamos falar do pobretão pai. Cara sério da qual puxei o gosto pelo alcool, que fica um cara super legal quando bebe mas no dia a dia é mais quieto e irritadiço com a merda que rola no país politicamente. Nossa relação é conversar sobre a política de São Paulo, beber e reclamar que nunca tem dinheiro. Putz, sou meu pai basicamente. Ele se fodeu ao ter 4 filhos, sendo apenas um homem e 3 mulheres.
Falei que sim pois como falei adoro aproveitar comida e bebida de graça. Meu pai logo cortou o barato e falou que iríamos pagar e que a minha parte eu pago. Fiquei triste e disse que ia mesmo assim para não decepcioná-lo. Lá se vai meu gasto de lazer com panicats, mas tudo bem, pai é pai.
Chegamos lá e esperávamos algo simples, conversa e tomar um vinho.
Era na porra da Moema (bairro nobre de São Paulo), restaurante chique, mercedes, Ford Edge e vimos uma merda de um Camaro no estacionamento. Chegamos com nosso Palio Velho 1997. O valet olhou com cara de cu, meu pai ficou triste e o sangue me subiu e acabei fazendo algo que nunca faço, que é gritar com funcionários pois sei como é ser pobre e maltratado.
- ALGUM PROBLEMA CARA? TÁ OLHANDO O QUE? ESTACIONA ESSA MERDA ANDA.
Bati a porta do carro, estufei meu peito inexistente com meus braços mais finos que palito de dente. Encarei o cara que pediu desculpas. Fiquei impressionado comigo, pois sou um cara pra baixo, triste e cordial devido baixa auto-estima e confiança mas ao ver um membro trabalhador da minha família, meu pobre pai eu fiquei completamente fora de controle. Meu pai não falou uma palavra.
Entramos no restaurante já num clima ruim, porém ao entrar a coisa piorou. Vimos uma estante inacreditável com vinhos lindos, com logomarcas legais e gente toda fina que só.
- Merda estamos fudidos – Disse meu pai
- Caralho pai, e agora, puta merda, meu deus do céu, onde fomos nos meter?
Falei isso olhando pro meu pai com a mão no rosto enquanto ele observava de frente pra estante de vinhos. Quando eu e meu pai falamos muito palavrão um pro outro é porque algo está rolando. Pelo menos é o que minha mãe diz.
Mas, de repente, chega o amigo dele todo feliz falando “Eiiiiii aqui está você meu grande amigo, chega, chega, vamos sentar aqui, já começamos a degustação, hoje é só vinho francês para avaliação, você gosta dos franceses"?
Meu pai que não entende porra nenhuma de vinho disse que sim, adora, e eu falei para quebrar o gelo:
- Mer si bocú
Meu pai me solta um olhar feio fulminante mas o amigo dele gargalha e diz que somos demais. Meu pai então deixou passar. Quase me borro nas calças com o olhar de meu pai mas fico aliviado.
Tinha vários caras fodas de médias empresas de auto-peças, rindo a toa com a merda do IPI que baixou e a demanda aquecida dos otários comprando carros. Meu pai se saiu muito bem ao falar de negócios. Eu soltava alguns comentários inteligentes graças ao meu amigo do blog finança inteligentes (valeu cara) e um velhão lá ficou entretido comigo pelas minhas anedotas e aventuras na bolsa.
Porém, na hora de falar de imóveis e vinhos é que começou nosso desespero. Começamos a ver que cada degustação de vinho era rateada mas como era muito gente era pouco vinho então vinha cada garrafa cara fodona que eu comecei a suar frio e meu pai só no disfarce. Não sabíamos o que comentar sobre o gosto, sabor, teor.
Primeiro eu falei pro meu pai “observa os caras e repete tudo”. Foi o que fizemos. Um velhão falou lá dos sabor e teor da merda do vinho e eu repetia o que ele falava adicionando algum adjetivo a mais parecido com o que ele falava. O cara apontou pra mim falando “ahááá esse é o cara, exatamente, o cara é bom hein, conhece”. O alcool ajudava nas amizades e meu pai pegou a tática e aplicou e começamos a nos dar bem demais. Cada comentário dos ricões nós seguíamos mudando as palavras e olhando pro teto ou pro sommelier com cara de entendido. Nos salvamos.
Ao final da noite meu pai ficou sozinho com o amigo cliente que falou que adorou nossa presença e disse que semana que vem passa para conversar sobre mais compras. Disfarçamos para poder sair sem que vissem o Palio 1997. O preço saiu caro pra caralho mas devido o alcool só no outro dia nos tocamos do rombo.
Meu pai no carro falou que foi ótimo para a carteira pois haviam mais 2 caras interessados em descontos e peças boas e que eu fui excelente no comportamento e vital para ajudá-lo a se sair bem diante da elite paulista.
É. É assim a vida de pobres. Tentando subir na vida, humilhados pela linda condição dos ricos, tentando subir como podemos, se abraçando na união familiar, sonhando com dias melhores.
Que delícia a vida dos ricos. É por isso que busco o milhão. Fique aí na sua vidinha de casado com 2 filhos.
Eu vou ser rico e você?