A tristeza de fazer aniversário sendo pobre
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A tristeza de fazer aniversário sendo pobre


Acordo. Mais um dia. Dia especial afinal é meu aniversário. Mais um ano de vida, mais um ano afastado da juventude mais um ano perto da morte.

Bora fazer minhas coisas usuais, pentear cabelo, escovar dente, tomar banho. Tomo o café tradicional de pobretão, pão, manteiga e queijo. Pego uma banana e como. Meu pai chega e diz parabéns, nos abraçamos. “Seu presente é hoje a noite ok?”. Ok digo eu. Minha mãe me abraço e me beija. “Mais um ano hein, ai tô ficando velha!”. Pois é, digo eu.

Rumo ao ônibus eu vejo que após esse início especial, tudo é o mesmo. Parar no ponto de ônibus, arrumar direito a gola na camisa. Observar com tristeza as várias gostosas andando e esperando no ponto me tratando como ser invisível. De fato, eu sou invisível. Eu sou um nada, um zé ninguém pra essas mulheres. E sempre serei assim. Suas coxas deliciosas, seus cabelos cheirosos, seus rostos lindos, suas bunda e peitos firmes, diariamente me bombardeiam e sei que nunca as terei. Pelo menos enquanto pobre ridículo inútil.

Esses pensamentos humilhantes passam na minha cabeça. Pego ônibus, torcida pra não ter que ficar em pé. Fico em pé. Poxa nem no dia do meu aniversário? Bem, a prefeitura podia decretar que aniversariantes tem que ir em pé no busão. Eu me perco nesses pensamentos banais toscos, de alguém que torce e vibra por conseguir sentar no ônibus todo dia. Uau, mais um ano de vida. Hora do metrô. Desce escadas, entro, em pé de novo. Começo a pensar que todos no trabalho irão passar o dia me dando parabéns. Começo a ficar irritado.

Chego no trabalho me preparando psicologicamente. Mal piso o pé no escritório, depois de escapar de conhecidos nos elevadores, já vem engraçadinhos dando parabéns. “Parabéns, pobretão, boa, quantos anos, e aí, sushizão hoje? Belezaaaaa”. No dia do meu aniversário já tá combinado essa merda de sushi. Vai se fuder.

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Sento na cadeira. Mais parabéns. Chega algumas mulheres para dar parabéns. Elas me abraçam. Aproveito para cheirar ao máximo seus perfumes e cabelos e tentar tocar alguma pele nas suas roupas, tipo braço ou costas. Elas me ignoram e não me tocam o ano inteiro enquanto eu me masturbo pensando nelas diariamente. Alguma casquinha preciso tirar dessas vacas falsas. De fato, a falsidade feminina é interessante. Elas são as mais empolgadas em ocasiões especiais ou quando alguém está no centro das atenções. Elas ficam mansas e receptivas. Os playboys alfas também me dão parabéns. Aperto de mão forte, tapas fortes nas costas, abraços de lado com mãos nos ombros, falando alto e colocando mulher e dinheiro no meio dos parabéns. Não mudam nunca.

Chegam os chefes e me dão parabéns. Eles cumprem o script da empresa, dão um discursinho, abracinhos, elogios falsos, tentam simular que se importam com o empregado. Fico com raiva da falsidade desses filhas da puta. Gritam, me maltratam, me alfinetam, me dão trabalhos horríveis, não me dão promoção, aumento, nada. E no aniversário fazem showzinho. A hipocrisia e jogo de imagens do mundo corporativo privado brasileiro me dá naúseas. É, mais um ano de vida.

Sento e abro o email. Hmm, parabéns corporativo no email padronizado do RH. Uau, me sinto especial. Depois desse momento diferente, tudo volta ao normal, a tristeza e torcida diária que as horas passem mais rápido.

Hora do almoço, lá vamos nós do setor comemorar “meu aniversário”. Vamos na merda do sushi. O início da conversa é meio direcionado à mim mas rapidamente o assunto revolve para outras coisas e posso voltar a me calar e pensar na vida de merda que tenho. Pelo menos eu não precisei pagar minha parte.

O dia termina. Adeus. Vamos pra casa. O stress do horário do rush é o mesmo. Chego em casa, cansado, rosto oleoso da poluição, triste, de saco cheio. Vejo a sala da minha humilde casa arrumada. Um simples bolo de chocolate de 25 reais com as velinhas representando minha idade, pratinhos enfileirados, alguns docinhos brigadeiro, uma caixa de salgadinhos com pastel, bolas de queijo, quibe e coxinha. Um balão simples e solitário pendurado no espelho. Minha mãe me recebe e diz tá tudo pronto pra família vir, vai tomar banho e ficar bonito. “Eu não consigo ficar bo….”, vejo que eu ia ser ranzinza e chato e logo me corrijo e digo “ok mãe!”, tentando aumentar o nível de energia. Sim, mais um ano de vida.

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Pessoal da família chega. Recebo a todos, vou recebendo meus presentes. Camisas, cuecas, jeans, perfume. Bom, bom. Minhas primas pau no cu me dão parabéns, sinto raiva de abraçá-las. A conversa rola. “Namorada pobretão, cadê"? “como vai o trabalho?”. Essas perguntas me matam de desgosto. Minhas irmãs ficam num canto fofocando com as primas, nem aí pra mim exceto a menor que fica perto de mim o tempo todo falando do bolo e das velas e do que vou pedir. “Vou pedir pra ser rico claro!”. “Ah, porque você não pede uma namorada"?”. Fico puto pois até minha irmã menor me enxerga como fracasso por não ter um caralho de namorada.

Termina isso tudo. Pessoal vai embora. Minha mãe começa a arrumar a casa de volta, meu pai bate um papo rápido comigo. Ele me deu uma camisa social pro trabalho. Minha mãe me deu um enfeite do time que torço. Agradeço, os abraço, dou beijos neles.

Deito na cama. Aguardo todos irem dormir. Vou pra geladeira e pego um resto de smirnoff de fins de semana de bebedeiras meus. Coloco dentro do meu armazenador de alcool (daqueles de filme, tipo cantil) e vou pro meu quarto.

Deito na cama, no quarto escuro e bebo tudo de uma vez. Uma solitária e lenta lágrima escorre do meu olho. Aqui ninguém pode ver meu choro e minha fraqueza. Aqui no escuro da minha cama simples de solteiro a sociedade não pode ver minha vulnerabilidade, nem homens poderão zombar de mim como se eu fosse fraco nem poderão gritar na minha cara “seja homem!” e nem poderão exigir sucesso automático e me culpar pela minha situação. As mulheres não podem me tratar como merda e invisível e destruir minha libido e masculinidade esfregando na minha cara sua sexualidade.

Todo ano é a mesma coisa. Todo ano minha vida é a mesma. Nada muda. Continuo invisível. Continuo odiado. Continuo andando pela sociedade como um nada, como um zé ninguém, sem brilho, sem luz, sem estrela, sem fazer nada de bom nem atingir nada de bom. Estou mais um ano mais velho, minha juventudade pré-25 se foi e me aproximo dos 30 anos sem nada para mostrar, sem nada para me orgulhar, sem nada pro futuro. É essa a vida que Deus planejou pra mim? Acordar, trabalhar por 50 anos, dormir e morrer? Será o destino de um pobretão a eterna luta infrutífera contra a pobreza e a sociedade feminista playboyzística?

Que merda, mais um ano de vida.

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