O estranho conceito de zerar a vida
Dinheiro e Negócios

O estranho conceito de zerar a vida


Mês passado um brasileiro de 18 anos que está fazendo intercâmbio na Austrália foi a primeira pessoa no mundo a comprar o recém-lançado Iphone 6S Plus.

Para conseguir esse feito, nosso jovem compatriota acampou durante cinco dias na frente da loja da Apple em Sidney. Assim que a loja abriu, ele entrou lá desesperadamente para pagar o equivalente a R$ 4,2 mil pelo novo telefone.

Durante seus quinze minutos segundos de fama, o sujeito declarou que por conta de tal proeza ele tinha "zerado a vida". Quem quiser saber mais sobre esse relevantíssimo acontecimento pode clicar aqui ou aqui.

O cara que "zerou a vida
"É só um menino de 18 anos queimando o dinheiro do pai", você pode estar pensando.

Concordo com esse pensamento, mas o fato é que esse fetiche que tanta gente tem pela Apple é um fenômeno mundial e que independe de idade.

Mas enfim, o post de hoje não será sobre o moleque da foto acima, nem sobre a Apple em específico, mas sim sobre a ideia de consumo como um todo, e sobre como grande parte das pessoas não se dá ao trabalho de refletir sobre questão tão importante.

Podemos começar nossa reflexão sobre o consumo? Podemos, mas não sem antes sentir mais uma dose de vergonha alheia proporcionada por outro Apple-maníaco:

AI MEU DEUS, COMO É BOM GASTAR DINHEIRO
Há uns 90 anos atrás, na aurora de nossa sociedade de consumo, as maiores fabricantes de lâmpadas do mundo (dentre elas General Electric e Philips) firmaram um contrato em que definiram que as lâmpadas não deveriam durar mais de 1.000 horas.

Considerando que naquela época já era perfeitamente possível fabricar lâmpadas que duravam mais de 2.500 horas, fica fácil deduzir que o acordo em questão tinha o intuito de fazer as pessoas comprarem mais lâmpadas.

Esse é tido como o primeiro caso documentalmente provado de obsolescência programada, em que o fabricante intencionalmente cria um produto programado para pifar ou se tornar menos funcional depois de determinado período de tempo.

Hoje em dia a obsolescência programada não é novidade para ninguém, estando mais presente do que nunca em itens tecnológicos (aquele seu notebook que começou a superaquecer, seu tablet cuja bateria foi pro brejo, seu celular que não suporta mais o sistema operacional do momento).

Embora a obsolescência programada ainda esteja presente nos dias de hoje, o fato é que de 90 anos pra cá surgiram estratégias mais sofisticadas para fazer o povo consumir como se não houvesse amanhã.

Descobriram, por exemplo, que era possível aplicar a psicanálise à publicidade, estimulando nas pessoas desejos e sentimento de recompensa, bem como plantando conceitos no inconsciente coletivo.

O pioneiro da psicanálise aplicada à publicidade foi um cara chamado Edward Bernays, sobrinho de Freud, que fez fortuna ao enfiar na mente dos homens de sua época que cigarro era símbolo de virilidade, ao mesmo tempo em que popularizava o fumo entre as mulheres como um sinônimo de independência feminina (dois conceitos completamente diferentes, mas isso pouco importa para quem estiver vendendo o produto).

Propaganda de 1949: pode fumar, amigão, seu dentista recomenda.
Mas vamos deixar o fumo de lado, pois a maioria das pessoas que está lendo este post não vivenciou os tempos áureos do cigarro (também não vivenciei), para tratar de um exemplo mais atual: carro.

Conseguiram, ao menos aqui no Brasil, convencer praticamente todo mundo que carro é sinônimo de sucesso, de poder econômico, que não dá pra viver sem carro, que quem não tem carro é pobre, que "brasileiro é apaixonado por carro", enfim, um monte de coisas que se tornaram dogmas incontestáveis no inconsciente coletivo nacional.

Eu sei bem que todo mundo tem 300 argumentos na ponta da língua para justificar a necessidade do carro, o que estou criticando acima é o pensamento "ou você tem carro ou você é um fudido", como se não existisse a opção de viver bem sem carro (existe essa opção, acredite se quiser).

Como carro é um tema que faria este post 10 quilômetros mais longo, vou passar para outros exemplos da atualidade: os dois mongóis nas fotos do início deste post, fazendo cara de "melhor dia da minha vida!!" pois compraram um celular que sairá de linha em seis meses, ou o cara que paga R$ 400 numa camisa da Dudalina "por causa do status, né brother?".

Se você torra seu suado dinheiro unicamente por causa do status ou por impulso, meus parabéns, você pensa da forma que querem que você pense e é a ovelha que querem que você seja, algo não muito diferente de quem passa na frente da vitrine da sapataria, não se contêm e sai de lá carregado de sacolas.

"Se entendermos o mecanismo e as motivações do pensamento coletivo, será possível controlar as massas de acordo com nossa vontade sem que elas saibam" - Edward Bernays (tradução livre)
Já entenderam o mecanismo em questão há muito tempo e a frase acima citada vem sendo posta em prática há várias décadas, de modo que hoje em dia nos identificamos com o conceito dominante de "necessidade" sem ao menos perceber. Que conceito dominante é esse? É a "criação organizada da insatisfação" descrita por Charles Kettering em 1929: é preciso plantar a insatisfação na mente das pessoas, pois se todos estivessem satisfeitos, ninguém compraria nada novo.

Sem percebermos, somos constantemente estimulados, voluntariamente por publicitários e involuntariamente pelas massas, a sentir insatisfação pelo que temos e querer trocar o antigo pelo novo. 

Você certamente faz um bem danado para a economia quando consome impensadamente, mas você também pode fazer um bem para economia (e para você mesmo) ao, em vez de consumir, aplicar seu dinheiro em renda fixa, FIIs, ações e dezenas de outras opções.

O fato é que, ao menos durante essa fase de acúmulo de capital em que o pessoal da blogosfera de finanças se encontra, quanto menos manipulável você for, maior sua chance de escapar da corrida dos ratos.

A questão é: o que fazer?

Usar o cérebro é uma opção

Como o problema não é o consumo em si, mas sim o consumo não precedido de reflexão, sugiro o seguinte: 

1ª dica: respeite o "gap" entre a vontade de comprar e a compra

A exemplo do sistema de "1 click to buy" iniciado pela Amazon e presente em grande parte dos sites, uma técnica de venda comum é diminuir o lapso temporal entre a vontade de comprar e a compra propriamente dita, por um motivo muito simples: quanto menos você pensar depois que bate aquela vontade de comprar, mais suscetível você está a acabar comprando. A primeira dica, portanto, é PENSE. Exclua o "gostei-comprei" da sua vida e tenha um momento de reflexão toda vez que você sentir vontade de comprar alguma coisa.

2ª dica: faça uma avaliação sincera sobre a necessidade da compra

"Eu vou usar esse troço regularmente?", "qual a chance dessa compra acabar abandonada num canto da casa?", "eu tenho uma necessidade genuína de comprar esse negócio ou é só para pagar de fodão perante terceiros?", "eu terei gastos adicionais com essa compra?", "eu sou tão impulsivo quanto um consumista dentro de uma loja de sapatos?", dentre outras perguntas.

3ª dica: troque o prazer em consumir pelo prazer em ver seu patrimônio crescer

Em vez de sentir prazer em ver seu dinheiro virando um monte de tralhas, que tal sentir prazer em ver o dinheiro virando mais dinheiro? Se a mágica dos juros compostos não te convence, eu sinceramente não sei  o que mais te convenceria.

Conclusão:

Sua busca pela independência financeira definitivamente será mais difícil se você não se desapegar do consumismo desenfreado praticado pelo brasileiro-médio. 

Esse desapego não é uma questão de sofrer por querer um Iphone 6S Plus e não tê-lo, mas sim desenvolver dentro de si mesmo um sentimento legítimo de que você não precisa de quinquilharias para se sentir bem.

Desenvolver esse sentimento te ajuda inclusive a alcançar a IF mais cedo, pois quanto mais lixo você quiser, mais capital terá que acumular para viver de renda passiva.

Desapega, meu amigo, e acumula capital enquanto seus pares estão lá tentando mostrar um pro outro como eles são a personificação do sucesso financeiro. 

Quando você parar de trabalhar para viver de renda passiva, a turma da ostentação vai perceber na hora que você zerou a vida e que está tarde demais para eles alcançarem o que você alcançou.

Cortei metade deste post fora para diminuir o tamanho (e mesmo assim ficou grande), então peço desculpas se algumas coisas que escrevi ficaram estranhas ou fora de contexto.

Aquele abraço!



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